Dom Henrique responde sobre o homossexualismo e o sacramento do matrimônio
Entrevista concedida ao jornalista
Romero Vieira Belo, de “O Jornal” pelo Cônego Henrique, hoje Bispo Dom
Henrique, da diocese de Aracaju, Sergipe
Baseada em quê a Igreja condena o
homossexualismo?
Primeiro, é necessário distinguir
homossexualidade e homossexuais.
A Igreja, fundada na Escritura, sempre
ensinou que o plano de Deus para a sexualidade humana é a complementaridade
homem-mulher: “Homem e mulher ele os criou!” A relação homoerótica não é de
acordo com o plano de Deus. No entanto, a Igreja também ensina que nenhum
de nós é mais aquele ser humano que Deus pensara desde o início: somos todos
meio desfigurados pelo pecado do mundo; todos temos tendências que nos
desfiguram. Ora, na visão cristã, o homoerotismo é uma deturpação do projeto de
Deus para a sexualidade. No entanto, as pessoas homossexuais não têm culpa de
terem essa tendência e devem ser tratadas com respeito e caridade. No entanto,
jamais a Igreja poderá dizer que a relação homossexual é um ideal ou que tanto
faz uma relação homo ou heterossexual. Realmente, a Escritura fecha essa possibilidade!
Dizer o contrário seria ser fiel à onda atual, mas infiel ao Cristo e ao seu
Evangelho.
Ao pregar que o sexo é só para
procriação, a Igreja não se distancia da realidade, já que a sociedade hoje vê
a relação sexual até como diversão?
A Igreja não prega isso!
O ato sexual é, primeiramente, uma
celebração do amor entre um homem e uma mulher que se amam e se deram na
construção de uma vida, “na alegria e na tristeza, na saúde e na doença,
amando-se e respeitando-se todos os dias” dessa vida comum… A procriação é
somente a segunda finalidade do ato sexual, mas não é essencial.
Um casal que já não possa ter filhos,
pode e deve continuar tendo uma vida sexual ativa, e uma vida prazerosa, onde o
amor é vivido como mistério de carinho, intimidade e sedução. Ao contrário do que
muitos pensam, a Igreja não tem horror à sexualidade! Quem duvidar,
compre um manual de moral católica e leia! O que a Igreja não pode é
concordar com a banalização da sexualidade instaurada no mundo de hoje. Aliás,
ninguém sério e que tenha um pouco de profundidade existencial pode concordar com
isso que está aí…
Faz sentido, a essa altura,
desestimular o uso da camisinha, expondo os jovens ao contágio da aids e outras
DSTs?
A pergunta é simplista demais; é
falaciosa.
Primeiro: o que a Igreja recrimina é um
programa de educação sexual que se fundamenta simplesmente no “use camisinha”.
Isso não é sério! No fundo, a mensagem termina sendo: “Chegou o Carnaval,
chegou o Natal, chegou o São João, faça sexo! Tudo é permitido, desde que
você use camisinha!” É o programa de banalização sexual do governo.
Ora, isso não é admissível! É preciso
falar de sexo e dizer a essa juventude que sexo tem a ver com amor, com
responsabilidade, com doação, com valores, com um projeto de vida! Nesse contexto é
admissível falar de preservativo, pois nem todos são cristãos e nem todos são
castos.
Em segundo lugar: para um cristão, o
ideal continua sendo a castidade, isto é, a vida sexual somente no casamento. O
sexo fora do casamento foi, é e continuará sendo pecado – esse é o ensinamento
do Evangelho e nem a Igreja nem ninguém pode mudar isso! Um discípulo de Cristo
que lhe queira ser fiel deve evitar relações fora do matrimônio, com ou sem
camisinha.
A crise sacerdotal não poderia ser
superada ou atenuada com o fim do celibato?
Primeiro, graças a Deus, o Brasil nunca
teve tantos seminaristas como agora. Só no ano passado tivemos sete ordenações
diaconais de uma só vez. Isso só ocorreu aqui em Maceió em 1941. Temos poucos
padres porque no Brasil sempre foi assim. Agora é que estamos melhorando. Em
segundo lugar, no Oriente, onde os padres católicos podem casar-se, há também
crise de vocações. A questão não é de facilidades, mas fidelidade e amor a
Jesus, que nos tornam capaz de dar a vida a ele e por ele!
Por que a Igreja defende tanto o
celibato, se a Bíblia não contém nenhuma objeção ao casamento de padres?
Realmente, o celibato é apenas um
conselho. No entanto, desde o princípio, a Igreja viu nele um valor, um sinal
de que não temos aqui na terra morada permanente e também um sinal de entrega
indivisa e total a Cristo e à sua missão. É bom recordar que o Cristo foi
celibatário, São Paulo também o foi e o recomenda.
Já no Novo Testamento, os ministros
ordenados podiam casar-se, mas, ficando viúvos, não poderiam se casar uma
segunda vez: deviam ser esposos de uma só mulher. No entanto, a Igreja no
Ocidente pode, um dia, mudar a obrigatoriedade do celibato. Como já disse, no
Oriente, ele só é obrigatório para os Bispos…
Em casos extremos, como os de crianças
nascidas sem cérebro, deve-se recorrer à eutanásia?
Não. Não compete a nós decidir quem
deve viver e morrer. Não somos Deus! Uma coisa é a morte como decorrência
natural de uma condição deficiente de saúde e outra, bem diferente, é a morte
provocada por antecipação em decorrência de convicções ideológicas. Para
Hitler, os judeus deveriam morrer porque eram uma raça maligna, os deficientes
mentais também. Agora, na Holanda, já se começa a assassinar recém-nascidos com
doenças graves. É uma barbárie assassina! Ou a vida humana é sempre humana e
deve ser preservada ou estamos abrindo as portas do inferno!
Imaginem quando se decidir matar
crianças pobres porque não darão lucro ao sistema ou matar velhinhos porque dão
prejuízo à previdência! É este o pecado original do homem: querer ser o seu
Deus, querer decidir de modo contrário a Deus o que é bem e o que é mal… Sempre
terminamos quebrando a cara!
Para a Igreja, quando começa a vida?
No momento da concepção.
O uso de células-tronco pode salvar
vidas, curar enfermos. Por que a Igreja é contra?
A pergunta não reflete a realidade. A
Igreja é a favor da pesquisa com células-tronco e aplaude tais pesquisas. Ela é
contra a pesquisa com células-tronco de embriões humanos, porque os mata. Os
embriões já são seres humanos! Assassinar seres humanos é imoral, é crime
sempre e em qualquer fase da existência.
Salvar vidas de uns matando outros é
imoral! Eu
posso dar minha vida por outra pessoa, mas ninguém pode me matar, tirar minha
vida contra minha vontade, para salvar outro alguém! A experiência com
células-tronco embrionárias é a vitória da razão assassina, da razão atéia, da
razão imoral!
A Igreja mantém sua posição contrária
ao aborto, mesmo em casos de estupro?
Sim. É muito fácil resolver o problema
matando o mais fraco.
Sabemos que a experiência de estupro é
traumática. Mas, isso não justifica moralmente matar a criança. A atitude
correta seria ajudar a mãe a ter seu filhinho e, se ela não quer criá-lo,
providenciar imediatamente uma adoção.
A família tradicional está se
decompondo? Há como salvá-la?
Sim, está. A família hoje é um pequeno
núcleo de um homem, uma mulher e duas ou três crianças, meio perdidos num mundo
que o pressiona por todos os lados. É triste, porque não há esperança para a
família – nem para nenhuma sociedade sadia – sem espírito de renúncia, sem
ideais, sem a capacidade de ser feliz na felicidade dos outros. Os valores
da sociedade moderna – que absolutiza o sucesso o bem-estar e o lucro -, privam
os filhos da presença dos pais, sobretudo da mãe e deixam a educação por conta
dos meios de comunicação e da escola, que já não educa, mas simplesmente
transmite conhecimentos. Ou se muda o paradigma de sociedade e de valores,
ou as conseqüências serão muito ruins.
Quem achar que estou sendo negativo,
olhe um pouquinho em volta e veja o que está acontecendo com nossos jovens e
crianças, que educação estão tendo, que valores estão assimilando… É
assustador… A salvação da família está na redescoberta de alguns valores
fundamentais, como a convivência, o diálogo, a sobriedade de vida, a
solidariedade e, não por último, a prática religiosa, o lugar de Deus na nossa
vida…
E o casamento? É instituição
ultrapassada?
Para o mundo atual, sim. Para os
cristãos, jamais!
O problema é que a liberdade descompromissada e o “faça-você-mesmo” que tem
substituído os valores cristãos, não realizam as pessoas. É uma falsa
liberdade, porque motivada por um egocentrismo de dar pena. Não se encontrará a
realização, a plena humanização por um caminho como esse… Os cristãos são
convidados a testemunhar os valores do Evangelho também na vida familiar,
matrimonial e sexual. Mas, isso só é possível quando a gente descobre o Cristo
de verdade. Caso contrário, as exigências do Evangelho não passarão de
moralismo castrador.
O catolicismo precisa mudar, se
abrir, para acompanhar as transformações que marcam os tempos hodiernos?
O catolicismo não deve se preocupar em
“acompanhar as transformações”, mas em ser fiel ao Evangelho.
Claro que a Igreja tem sempre o dever de
ser atenta ao melhor modo de se comunicar com a humanidade em cada época e
cultura. O Concílio Vaticano II, na década de 60, fez isso, preparando a Igreja
para o mundo atual. Mas, isso não quer dizer que a Igreja deva ou possa trair a
Verdade do Evangelho ou esconder as exigências morais que Cristo coloca para os
seus discípulos. Como dizia a Bem-aventurada Teresa de Calcutá, “nós não somos
chamados a fazer sucesso, mas a ser fiéis!” A Igreja, como um organismo
vivificado pelo Espírito Santo, estará sempre mudando para ser fiel à sua
missão. Mas, sua referência não são as modas do momento, mas unicamente o
Cristo, e Cristo crucificado e ressuscitado!
Será possível que o cristianismo,
daqui a alguns milênios, venha a perder sua essência histórica e transformar-se
em algo como uma lenda?
Isso aconteceria se, para agradar o
mundo, a Igreja entrasse na onda. Mas, não ocorrerá. Cristo prometeu que, na
força do seu Espírito Santo, estará sempre com sua Igreja. Ela já enfrentou as
perseguições do Império Romano, a tragédia das invasões bárbaras, as lutas
contra os tiranos do Sacro Império e dos monarcas absolutos, déspotas
esclarecidos ou não. A Igreja já enfrentou o cativeiro dos papas em Avinhão
durante quase setenta anos; sobreviveu à terrível experiência da dilaceração
com a Reforma protestante, suportou dez péssimos papas consecutivos na época do
Renascimento; já enfrentou a crítica do racionalismo, do iluminismo e do
humanismo ateu do século XIX; sobreviveu à perseguição terrível dos regimes
pagãos do século XX: o fascismo, o marxismo e o nazismo. Agora luta contra
novos gigantes: a secularização, o consumismo, o ateísmo prático, a onda
anti-cristã dos meios de comunicação de massa… E vencerá, mais uma vez. Ela perderá sempre
mais poder político, poder de barganha, prestígio e até número de fiéis. Mas,
isso, ela nunca deveria ter tido; a sua força não consiste nisso. Sua
glória, sua força, seu arrimo é unicamente Cristo, loucura, escândalo e
fraqueza para o mundo, sabedoria e poder de Deus para os que crêem… “As portas
do inferno não prevalecerão” – a promessa do Senhor a Pedro continua de pé!
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