Queridos irmãos,
queridas irmãs, a paz! Um leigo católico, Harun Salman, que conviveu e
trabalhou com Madre Teresa de Calcutá, nos dá seu testemunho.
“A Madre não fazia proselitismo; evangelizava”
Filho de uma família altamente cosmopolita, cresci entre Sussex
(Inglaterra) e Sringeri (Índia), com eventuais férias no Brasil. Um dia, ouvi
alguém dizer que “o santo é a criatura humana plenamente realizada”. Pronto.
Decidi ser santo. Minhas primeiras referências foram Swami Chinmayananda, um
líder hindu, e Madre Teresa.
Convivi com os dois. Com Swami Chinmayananda, aprendi sânscrito e
vedanta. Com Madre Teresa, aprendi a amar Jesus. Estudar com Swamiji (uma forma
carinhosa de chamar Swami) foi fácil. Ele e seus discípulos davam aula perto de
casa. Porém, trabalhar com Madre Teresa foi bem mais difícil. Ela percorria
ambientes perigosos, trabalhava muito e não podia perder tempo catequizando um
moleque com pretensões à santidade.
Tive que esperar pela autorização dos meus pais. Finalmente a
autorização veio. Era 1979. Eu não tinha mais o cabelo azul da rebeldia. Tinha
estudado enfermagem. Falava hindi, sânscrito, tâmil e malayalam. Era o melhor
aluno do colégio, campeão de matemática. Parecia um menino ajuizado. Era um bom
ator. Meus pais acreditaram. E, aos 15 anos, conheci minha heroína.
Eu era apenas mais um de uma grande turma de estudantes ingleses, uma
garotada que queria “fazer a sua parte”. Madre Teresa nos olhou com simpatia e
gentileza, mas não sem certa contrariedade. E nos pôs para trabalhar,
inicialmente, pequenas tarefas: varrer o dispensário, lavar o chão, cortar
vagens.
Aos poucos, os que
mostravam resistência iam ganhando mais tarefas. A maioria ia desistindo. Dessa
turma inicial, só eu perseverei.
Madre Teresa chegava para a missa e lá
estava eu. Teimoso. Acho que ela começou a achar engraçado. Ganhei mais
responsabilidades. Fui autorizado a trabalhar em Nirmal Hriday, um local
fundado pela Madre para que as pessoas destituídas (“os mais pobres entre os
pobres”) não agonizassem como animais, nas ruas, mas tivessem seus últimos momentos
cercadas de amor.
A Madre não fazia proselitismo;
evangelizava. Cada moribundo recebia atenção conforme a sua fé.
Chamávamos sacerdotes hindus e pândits quando necessário. Frequentemente, eles
não vinham. Por isso, memorizei o “Garuda Purana”, um texto hindu, que fala do
pós-morte, com o equivalente hindu de Céu, Inferno e Purgatório. Um senhor que
estava no final da vida pediu-me que o recitasse. Recitei. Ele perguntou como
eu sabia aquilo. E eu disse que Jesus também ensinava sobre Swarga (o Céu).
“Quem é Jesus?”, ele perguntou, querendo evidentemente uma resposta filosófica
(hindus são muito introspectivos). Eu respondi: “Jesus é o começo e o fim”. Ele
suspirou: “Oh! Eu amo Jesus!”, e morreu.
A maioria estava lá
morrendo mesmo. Levantei os olhos para chamar alguém e dei de cara com Madre
Teresa. Devo ter feito alguma coisa bem, pois me foram confiadas novas tarefas.
Ajudei a separar aqueles que na verdade não estavam morrendo, mas só precisavam
de atendimento médico. Não podíamos pagar táxis (dinheiro era
sempre um problema), por isso, quando um paciente precisava ser levado para o
hospital, eu o carregava. Sou forte, isso nunca foi problema.
O trabalho, que já era muito, aumentou.
Fui autorizado a trabalhar em Shanti Nagar, uma “cidade” fundada por Madre
Teresa para abrigar os hansenianos, sempre vítimas de preconceito (leia-se
violência). Amei o trabalho! Era exaustivo, mas apaixonante! Faltavam
recursos, sobrava amor! Madre Teresa precisava estar em constante
movimento, pedindo ajuda para os recursos mais elementares. Nunca sabíamos de
onde viria a comida, no dia seguinte. Nem se haveria comida, no dia seguinte.
Vivíamos da Providência, literalmente! Por isso, vivíamos em oração.
Sem oração, eu
entraria em pane! Aprendia-se a orar na marra! Madre Teresa era absolutamente
gentil, com todo mundo. Mas nem um pouco sentimental. Era firme, decidida,
prática. Não ficava sorrindo à toa, feito uma pateta, nem vivia de cara
amarrada. Gostava de cantar e de que cantassem. Ela gostava muito de me ouvir
cantar “À la claire fontaine”, uma canção infantil, e “Teresinha de Jesus”.
Traduzi a letra para a Madre, e ela observou que era um ensinamento sobre a
Santíssima Trindade (“Acudiram três cavalheiros…”). E é mesmo!
Ela trabalhava mais
do que qualquer pessoa que eu conheci. A qualquer momento que alguém olhasse
para ela, ela estaria trabalhando, sem sair do estado orante. Eu vi sua saúde
declinar, ao longo dos anos. Ficava impaciente quando sua energia física não
acompanhava sua incrível energia espiritual.
Quando eu perdi minha
família, foi nela que eu encontrei conforto. Quando meus amigos, a mulher que
eu amava e toda a sua família foram mortos num terrível massacre, em 1994, foi
nela, velhinha e muito doente, que eu encontrei conforto. O que ela disse?
Nada. Ela simplesmente estava lá.
Fonte: Blog ocatequista
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