Dom Fernando Arêas Rifan*
Diante da derrocada dos valores familiares humanos e cristãos, pareceu-me interessante a seguinte crônica.
Alguns anos depois que nasci, meu pai conheceu uma estranha, recém-chegada à nossa pequena cidade. Desde o princípio, meu pai ficou fascinado com esta encantadora personagem, e em seguida a convidou a viver com nossa família. A estranha aceitou e desde então tem estado conosco. Um intruso simpático e maldoso, sem cerimônia.
Intrigante o lugar que ela ocupou em nossa família. Meus pais tentavam nos dar boa educação. Minha mãe nos ensinou o que era bom e o que era mau e meu pai a obedecer. Eles nos transmitiam valores éticos. Ensinavam-nos a rezar. Mas eles eram apenas instrutores complementares, porque a estranha intrometida era nossa verdadeira educadora. Mantinha-nos enfeitiçados por horas. Ela falava sobre todos os assuntos: política, esportes, história, ciência, família e comportamentos. Fascinante, fazia-nos rir e chorar. Ela misturava coisas boas às ruins, como fazem todos os promotores do mal. Ela tirou a oração da nossa casa. Destruiu também a conversa, o diálogo sadio da família. Ela ensinou charmosamente que o namoro indecente, o adultério, o ódio, a vingança, a violência eram coisas normais. A estranha nunca parava de falar, mas o meu pai não se importava. Às vezes, minha mãe dormia e se levantava cedo, enquanto o resto de nós ficava escutando a intrusa até tarde. Ela divertia, mas nos estressava.
Meu pai dirigia nosso lar com certas convicções morais, mas a estranha nunca se sentia obrigada a honrá-las. Aliás, o que era a normativa dela era o dinheiro e não a ética. As blasfêmias, os palavrões, por exemplo, não eram permitidos em nossa casa. Entretanto, nossa visitante de longo prazo, usava sem problemas sua linguagem inapropriada que às vezes queimava meus ouvidos e que fazia meu pai se retorcer e minha mãe se envergonhar. Pelo menos, no começo. Meu pai nunca nos deu permissão para tomar álcool. Mas a estranha nos animou a tentá-lo e a fazê-lo regularmente. Falava livremente sobre sexo. Seus comentários eram às vezes evidentes, outras sugestivos, e geralmente vergonhosos.
Agora sei que meus conceitos sobre relações foram influenciados fortemente durante minha adolescência pela estranha intrusa. Repetidas vezes a criticaram, mas ela nunca fez caso dos valores de meus pais; mesmo assim, permaneceu em nosso lar. Passaram-se mais de cinquenta anos desde que ela veio para nossa casa. Ela mudou de roupa e penteado. Mas continua a formar conceitos, a destruir a união das famílias, a ensinar moral não cristã e permissiva. Ela (de)forma os jovens, entretém os adultos e é babá corruptora das crianças.
Seu nome? Nós a chamamos de Televisão... Agora ela tem um marido que se chama Computador, seus filhos são, o Tablet, o iPad, e um filho adotivo, o Celular...!
Aparelhos, digo eu, úteis se bem utilizados, são perniciosos quando sem controle, criando dependência, destruidores do diálogo sadio e verdadeiros veículos de lixo.
*Bispo da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney
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