A vocação da Igreja é a salvação das almas. Devido a este fato compreende-se as palavras do Santo Padre Pio: “A Igreja não precisa de mim; eu preciso da Igreja.”
No itinerário desta vocação, observamos a Igreja – que entendo ser um organismo vivo com a aparência de organização, de um ente meramente lógico como são todas as organizações – tomando decisões que parecem escandalosas ou loucas, como disse São Paulo em ICor 1, 23: “...Cristo crucificado... escândalo para os judeus e loucura para os gregos.” Creio que se deve entender “judeus” e “gregos” como categorias que podem ser reduzidas à estrutura do ser humano, corpo e alma; os milagres, por serem acontecimentos físicos, relacionados a coisas corpóreas e a sabedoria, à alma. Seria como dizer que para os políticos e empresários, a Igreja é escandalosa, e, para os intelectuais, louca.
Mas quando a loucura tem método, então é bom estar atento a algo mais que pode-lhe estar por trás. Tanto mais quando estamos falando da Igreja e de sua vocação. Ela foi criada para uma finalidade exclusiva: salvar almas. Neste procedimento, é de se notar a presença de tamanha tolerância que ela é dita ser “mãe”, isto é, criatura cujo “combustível” de existência é o amor, e amor de caridade. Por isso, ela, como “Reino dos Céus”, é “...semelhante a uma rede lançada ao mar, e que apanha toda a qualidade de peixes.”(Mat. 13, 47). (Nesta parte meu coração diz: ainda bem! Então nela há lugar para mim, pois nela cabem peixes nobres e bagres). E sua loucura é exatamente esta, existir tão-somente para a salvação das almas, para a salvação de “todo tipo de ‘peixe’”, dentre os quais, nós.
Vale aqui lembrar o que foi tema do artigo semanal do Bispo Dom Fernando Arêas Rifan, para a Folha, intitulado “O padroeiro dos políticos”, Santo Tomás More, de quem disse: “ Lorde Chanceler do Reino da Inglaterra, por não ter aceito o divórcio e o cisma do rei Henrique VIII, foi condenado à morte por traição e decapitado em 1535. Preferiu perder o cargo e a vida a trair sua consciência. A Igreja o proclamou padroeiro dos Governantes e dos Políticos, exatamente porque soube ser coerente com os princípios morais e cristãos até ao martírio. O belo filme da sua vida, em português, que recomendo, intitula-se “O homem que não vendeu sua alma!”.
Este santo, como inúmeros outros, sacrificaram o primeiro e mais precioso de todos os bens, a própria vida. Isto fizeram porque não negaram a própria vocação. E aí perguntamos: será que na Igreja é possível identificar feito de mesma envergadura, uma vez que há quem creia que ela é “um organismo vivo, com a aparência de simples ente lógico, isto é, organização”? Creio que sim. A Igreja testemunha o que solicita ao crente. Vejamos como pode ser isso.
Uma organização, para continuar existindo, não abre mão – não pode abrir mão – de seus “clientes”. O executivo-chefe da organização, por esta razão, não pode de maneira alguma desagradar aos “clientes”. Numa palavra, o chefe de toda a organização não pode desagradar ao seu “cliente”. Não pode fazer, por exemplo, o que o Beato Papa João Paulo II fez em sua ida aos Estados Unidos (outros exemplos semelhantes, na Igreja, poderiam ser citados). Quando da morte deste que agora é Beato, a Rede Vida exibiu um documentário sobre ele e ficou marcada em minha mente os comentários de Henry Kissinger, que foi Secretário de Estado Americano. Ele disse: ‘Nunca me interessei por religião, mas o Papa João Paulo II chamou a minha atenção e quis falar com ele, para perguntar-lhe algo: ‘Sua Santidade, eu sou um homem de negócios e um politico. E como uma ou ambas essas coisas, sei que não posso nunca desagradar meus clientes para que meus negócios vão bem. O Sr. aqui, nos Estados Unidos, fez o contrário: falou contra o consumismo e demais coisas que, católico ou não, todo americano pratica. O Sr. não acha que desagradando seus clientes, os perderá?’ Ele me respondeu: ‘A Igreja não é uma organização política. Seu compromisso é ensinar o que Cristo mandou ensinar. E eu, como Papa, como chefe da Igreja, tenho a obrigação de falar a verdade. Se alguém a ouvirá, não me pertence julgar o fazer que isso aconteça. Eu tenho a obrigação de falar e dar testemunho da verdade. Quem a faz escutar é o Espírito Santo’.” Disse então Henry Kissinger que passou a admirar este homem.
Pois bem, o que a Igreja sacrificou, que poderia ser comparável ao sacrifício da vida dos mártires? A Igreja sacrificou impérios inteiros, isto é, abriu mão deles ou, na linguagem medieval, “relaxou-os ao mundo” por amor à verdade e à obediência e por rejeição do pecado.
Recordo-me de três fatos históricos de enorme amplitude histórica, econômica, política, que podem ser mencionados. O primeiro, a excomunhão de Nestório, Bispo de Constantinopla, em 1054. Vivia em condição de pecado publicamente conhecida, razão porque foi-lhe negada a comunhão. Em resultado reagiu e insurgiu-se contra a Igreja, procedendo de tal modo que acabou excomungado
Em 1311 a Igreja excluiu os Templários, cujos últimos 50 anos anos (de um total de aproximadamente 250) foram consumidos em práticas de pecados que bradam aos céus.
Em 1533 excomungou o rei inglês Henrique VIII para não consentir com seu divórcio – na Igreja não há divórcio.
Nos três casos, a razão seria relevada pelo homem politico ou empresário: o pecado contra a castidade. Para não consentir com tal pecado, a Igreja abriu mão de impérios e poderes que nenhuma potência deste mundo recusaria, pois faze-lo seria o mesmo que renunciar à própria vida, como fez Santo Tomás More e outros.
Por que a Igreja age assim? Porque sua vocação é a salvação das almas e ela não trai nem pode trair tal vocação.
Joel Nunes dos Santos, em 23 de junho de 2012.
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