domingo, 29 de abril de 2012
Vocação ao Amor, da Mulher e do Homem
No domingo seguinte em que o STF brasileiro decidiu a favor do aborto de crianças anencéfalas, escrevi no artigo semanal que não é correto considerar, como fez um dos ministros, que a gestação de criança anencéfala “é motivo de grande sofrimento para a mãe.’’ Aprofundo um pouco mais o assunto, apresentando a razão de fundo do meu ponto-de-vista.
Ao longo dos anos em que meditei e procurei compreender a diferença entre a mulher e o homem, várias coisas me chamaram a atenção, tanto do homem em relação aos demais animais (só o homem possui polegar, por exemplo; só o homem recusa alimento por razões estéticas; só o homem jejua, enquanto os demais animais somente passam fome; e assim por diante), quanto da mulher em relação o homem. De todas as diferenças, a que mais me impressionou foi entre a maneira de amar do homem e da mulher. O amor da mulher é basicamente incondicional, enquanto o do homem é condicional.
Para designar esta diferença com palavras que a resumisse, entendi adequado denominar o amor da mulher de “substancial” e o do homem, “formal”. “Substancial” porque é desencadeado e se dirige diretamente ao que possui vida; “formal” porque é desencadeado e dirige-se não propriamente ao que possui vida, mas a algo que a vida possui ou manifesta. Um exemplo ajuda a esclarecer a diferença entre uma coisa e outra.
Conheço uma mulher que era exímia violonista. Executava com perfeição as obras para violão de Villa Lobos, a meu ver talvez o mais difícil compositor para este instrumento, seus estudos e prelúdios exigindo técnica tão especial que é raro encontrar violonista que a possua. Pois bem, além de exímia violonista, fumava e era também viciada em chocolate. Quando engravidou de sua primeira filha, nunca mais tocou violão, fumou ou comeu chocolate. A sua filha lhe bastava. Seu amor era tão denso que não precisava de nenhum outro motivo de alegria. A lista de exemplos parecidos é enorme, infindável.
E como é esta mesma coisa com o homem? Suponha que um homem, à semelhança da mulher acima, pegasse gosto por alguma coisa tão somente para impressionar a alguma mulher por quem se apaixonasse. Digamos que ele aprendesse a tocar Villa Lobos ao violão porque isso impressionaria sua amada. Uma vez surgido o gosto – pela arte, filosofia, ciência ou o que mais for – mesmo que frustre aquele amor, ele continuará tocando violão, filosofando, etc.. Quer dizer, ele conservará o amor por algo que não possui vida, mas que serve à vida, embelezando-a, ilustrando-a, etc. Ao contrário, se a mulher passa a gostar de arte ou qualquer outra coisa porque aquele a quem ama gosta dessas coisas, ao frustrar o romance, o seu coração simplesmente perde o interesse pelo assunto.
Por isso é visível que a mulher abre mão de toda e qualquer coisa, primeiro pelo homem por quem se apaixona e depois (principalmente) pela criança que gesta e dá luz. Assim, as palavras que poderiam provocar no homem assombro, dor, tristeza, esfriamento do amor, na mulher desencadeia o efeito contrário. Se a mulher ouve ou suspeita que seu filho tem ou poderá ter tal deficiência, então no seu coração brota a decisão de amá-lo mais ainda justamente porque ele nascerá com desvantagens.
Quem duvide de que seja assim, observe à sua volta e notará a enorme quantidade de mulheres que são tão mais apaixonadas pelos que escolhem quanto mais sejam indivíduos instáveis, fracos, com deficiência de caráter. Fato este que me chamou a atenção desde o início de minha adolescência: observei que as garotas, quando tinham de escolher entre um rapaz seguro, moralizado, pouco dado à mentira, etc., e um outro a quem na época era denominado “pilantra”, este último tinha a preferência. Por que isso?, perguntei-me ao longo de aproximadamente duas décadas. A resposta veio da boca de uma conhecida que, numa conversa informal, queixando-se de algum amor frustrado, disse “a mulher é trouxa, mesmo; ela geralmente só consegue gostar do torto, do que tá errado, porque isso a faz sentir-se útil. A mulher parece que nasceu pra consertar o que é torto”. Até hoje não encontrei razão para discordar dessas palavras.
Ora, que coisa mais útil pode haver que cumular de mais amor o (a) filho(a) mais fraco e indefeso? É assim que o coração da mãe procede, por causa da natureza substancial do seu amor. Muito possivelmente foi por esta razão que um sacerdote uma vez disse que “o amor de Deus é feminino”, pois quanto mais fraca é a criatura, mas Ele a ama e ela Se dá.
Por isso entendo que o ministro referido no início do artigo errou ao basear o seu voto no que seria verdadeiro caso quem gestasse a criança fosse um homem. Não é. Quem gesta criança é a mulher, e esta ama substancialmente; portanto, seu amor é tanto maior quanto mais frágil é ou pode ser sua criança.
Joel Nunes dos Santos, em 28 de abril de 2012.
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