domingo, 16 de outubro de 2011

Vocação e Admiração

Admiração é o oposto de inveja. Invejoso é aquele que se sente mal com o bem do outro: o outro consegue um emprego, consegue algum prêmio e o coração do invejoso se entristece com isso.

Admiração de “ad”, “para, em direção de” e “mirar”, olhar. Trata-se de olhar para o outro como se estivesse vendo a si mesmo num espelho, o qual reflete não a imagem física da pessoa, mas determinada aspiração elevada. Quem admira vê no outro a imagem de algo a ser imitado. A admiração é como se a pessoa dissesse em seu coração “aquela pessoa é tão boa, eficiente, etc., no que faz quanto eu no que faço”; ou: “desejo ser em minha vida o que aquela pessoa é na dela”.

A admiração, assim como a inveja, são desejos, este negativo e aquele positivo. Aquela reflete o êxito de a pessoa atender ao “chamamento a uma vida feliz”, a tradução literal do nome “vocação”; esta, o fracasso ou a recusa de atender a este mesmo chamado, de fornecer à vocação os instrumentos de que ela precisa para manifestar-se como deve.

Não poderia deixar de acrescentar à admiração a questão da devoção.

A devoção não é um simples desejo, mas a prática que afirma diuturnamente o mais elevado dentre eles. Se sou devoto de São José, não é que apenas o admiro, mas que tento me comportar, interna e externamente, como se pensasse “quero ser e fazer igualzinho São José seria e faria isto aqui e agora”. A admiração aumenta a devoção e vice-versa. Vejamos como.

Quando me coloco imaginativamente no lugar de São José, como um devoto seu, transporto-me às condições reais e concretas de sua vida e me lembro que ele era o custódio de Nosso Senhor que, sendo Deus, penetra nas almas de todos. Vejo então São José ensinando os procedimentos de carpintaria a Jesus, o qual então imagino fazendo (inventando) utensílios tão surpreendentes neste ofício que por certo se incorporaram à vida do homem em geral de maneira tão suave que a ninguém ocorreu pesquisar sua autoria. E se isso é algo admirável, mais admirável ainda é constatar a pureza de alma de São José, a quem Jesus (que perscruta a alma do homem) chamou “pai”! Quanta pureza haveria de ter o coração e toda a vida deste homem escolhido pelo próprio Deus para ser Seu custódio. Tudo isso provoca admiração e aumenta a prática da devoção, a qual abre o coração para encontrar mais motivos para ficar admirado com ele.

A admiração presume na alma da pessoa o inverso da inveja, uma vez que no coração do invejoso está estabelecido que ele não é semelhante ao outro tanto no ser quanto no possuir. Há entre o invejoso e invejado um enorme abismo; um abismo provocado pela certeza interior de que ele, o invejoso, não poderia nunca assemelhar-se àquele a quem inveja. A admiração pressupõe o contrário disso. Ela pressupõe uma igualdade entre o admirador e o admirado; igualdade não presente, mas igualdade desejada, futura. O admirador deseja ardentemente assemelhar-se àquele a quem admira, como se esta pessoa fosse sua imagem no espelho. Se admiro São José, é porque desejo ardentemente fazer jus ao que ele é, o que conseguirei no futuro, na condição de que no presente me empenhe neste propósito. A minha admiração por São José significa esforço para no futuro ser igual a ele. Mas a este esforço dá-se o nome de devoção.

Deus colocou em cada homem a possibilidade de admirar, o que faz lembrar palavras do dr. Adib Jatene, médico, sobre um engano na mentalidade atual. Para ele, “as pessoas devem se esforçar por serem boas e não por serem melhores!” O que significa dizer que se a competição é saudável – o esforço de fazer melhor algo que já tenha sido feito, como o médico diagnosticar melhor do que diagnosticava o seu professor – isto não quer dizer que a vida deva ser vivida como se fosse um jogo; mas deve ser vivida como um esforço permanente de ser tão bom como é possível ser. Por mais atencioso, amoroso, trabalhador, etc., que seja um pai, nenhum conseguirá ser melhor do que São José, pela simples razão de que Deus o cumulou de tantas graças como a nenhum outro homem, a principal das quais a de ser custódio do Redentor, o que nenhum de nossos filhos é. Escolheu-o para tomar conta da mais esplêndida e maravilhosa de todas as criaturas, a eternamente virgem Maria; para tomar conta de Si, como seu custódio. A qual homem foi dada maior graça e, por isso, maior responsabilidade? Não é capaz de superá-lo em qualquer dessas coisas. Quem pôde ser chamado de esposo por aquela de quem todo sensato deve tornar-se escravo? Quem pôde ser chamado de pai pelo Redentor do gênero humano?

A vocação, “chamado de Deus”, é um convite para cada um refletir maximamente a imagem daquele a quem se devociona, respeitando-se o estado de vida de cada um. O início deste esforço dá-se pela fidelidade à vocação natural. Pois esta pode também ser entendida como aquele pouco a que cada um deve ser fiel, de modo que muito mais lhe seja dado, igualzinho podemos ler na “Parábola dos Talentos”, quando o Senhor diz: “Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Vem regozijar-te com teu senhor.”

Joel Nunes dos Santos, em 14 de outubro de 2011.

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