No almoço com algumas pessoas conhecidas, estava à mesa um amigo que comentou sobre um artigo de revista de grande circulação a respeito dos “2% mais inteligentes do vestibular”. Disse que esse percentual é preenchido por alunos de Medicina, e perguntou se eu concordo com isso.
Respondi que a mim não parece simples esta questão, uma vez que não existe consenso quanto às modernas definições de inteligência. Mesmo o QI (Quociente de Inteligência), a que as publicações se referem como se fosse algo firme e cientificamente estabelecido, carece de unanimidade, uma vez que este instrumento de medição não fornece definição de inteligência.
A definição de inteligência que está pressuposta no meu pensamento a respeito é “a capacidade de perceber e admitir o real”, expressão extensa do que sinteticamente se expressa pelo substantivo “humildade”. Ser inteligente é caminhar na direção que culmina com a visão de Deus. Ora, antes disso, é preciso ser capaz de ver os sinais e vestígios de Deus nas coisas e em nós mesmos, de modo que nessa prática vamos conhecendo progressivamente um pouco deDeus, que adoramos e devemos amar.
Prosseguindo meu raciocínio sobre os 2% inteligentes no vestibular, entendo que este percentual representa o número indivíduos com vocação estritamente compatível com o exercício da Medicina.
A Medicina não se apoia em raciocínios lógicos, mas na experiência. Quem tenha amigo médico compreende rapidamente isto. O médico enquanto tal não adota este ou aquele procedimento porque é lógico fazê-lo mas, sim, porque a experiência demonstra que ele é o mais eficaz. Ele nem precisa entender por que o procedimento funciona – para ele, basta que funciona e pronto.
Acontece que algo assim é capaz de abalar o equilíbrio nervoso daqueles não dotados de vocação compatível com o exercício da Medicina. É mais comum que haja maior número de pessoas que exijam coerência lógica mais do que a funcionalidade deste ou daquele procedimento. Ou seja, é maior o número de indivíduos com vocação compatível com o exercício da Engenharia, por exemplo, do que com o da Medicina. A inteligência requerida para o exercício desta disciplina é grandemente baseado na memória, enquanto que a requerida para o exercício daquela outra é o raciocínio lógico e dedutivo. O vocacionado ao exercício da Medicina possui uma maior disposição interior para decorar informações do que o proponente à Engenharia que, por ter como instrumento de trabalho a matemática, deve ser hábil em fazer deduções, inferências lógicas e assim por diante.
A noção de inteligência como capacidade para perceber e aceitar o real, sem modifica-lo na própria mente, permite entender que todo indivíduo é tanto mais inteligente quanto mais escorado esteja no que lhe é vocacional. Quanto mais aplique sua atenção e inteligência ao objeto conatural com sua vocação, mais inteligente demonstrará ser. Porque naquilo que é vocacional, o indivíduo age com e por amor; numa palavra, não colide com o que percebe, mas o aceita e a partir dele formata a própria inteligência, adaptando-a a ele. Noutras palavras, naquilo que é vocacional a força da humildade se manifesta com mais ênfase.
Mas em qualquer dos casos ficará perceptível a limitação de cada pessoa: o indivíduo cujo máximo da inteligência o encaminha naturalmente para a Medicina dará mostras de ser extremamente inábil em outros setores de conhecimento nos quais se encaixaria confortavelmente a inteligência de vocacionados à Engenharia ou a outro ramo de conhecimento.
Para ajudar o indivíduo a desenvolver a virtude da humildade – portanto, a ser mais inteligente – convém estimulá-lo naquilo para o que é vocacionado. Assim fazendo, é possível contar que surgirá um maior número de indivíduos vocacionados à vida sacerdotal, que parece ser muitíssimo menor do que o número dos vocacionados à Medicina. E ninguém, em seu são juízo, diria que a vocação que conduz a servir mais diretamente a Deus requer inteligência menor do que para aprender procedimentos que restaurem ou mantenham a saúde física do homem.
Joel Nunes dos Santos, em 24 de setembro de 2011.
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