sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

VER. HERMES RODRIGUES NERY

“VALEU A PENA? TUDO VALE A PENA, SE A ALMA NÃO É PEQUENA!”

Discurso de Despedida da Presidência da Câmara Municipal
de São Bento do Sapucaí - 23 de dezembro de 2010

Prezados colegas vereadores,
Caríssimos munícipes presentes,

“Quanto mais fores elevado, mais te humilharás em tudo”
(Eclesiástico 3, 20)

Chegamos ao final do mandato de Presidente da Câmara Municipal. “A esperança promete tanto, mas quão pouco a vida concede!”1 Mesmo assim labutamos, até o último grão de areia da ampulheta, confiante em Deus, sempre providente. Agora, o mandato passou, já é história e memória. “Importante não é a herança do passado, e sim o que fazemos com ela, na direção do futuro”.2
Confesso o meu cansaço e ainda alguma tristeza por esta experiência que me fez conhecer tão por dentro e tão profundamente a lógica do poder deste mundo, que hoje posso dizer com mais convicção o quanto abomino esta lógica em que prevalecem interesses apenas, e não dá o mínimo espaço para a gratuidade, a amizade, a leveza da alma, a verdade, a bondade, a gratidão, enfim, aos caros valores cristãos. Mais uma vez a história confirma o que Jesus disse a Pilatos: “O meu Reino não é deste mundo”.3 Mas também uma límpida alegria em manter a fidelidade nos valores que defendo e acredito: os princípios e valores do humanismo integral, à luz da doutrina social da Igreja.
São Bento do Sapucaí continuará “aninhado entre as montanhas” 4, a dormir “em solidão, sob o êxtase dos píncaros de um azul turvo?”5, a jazer “sob o luar que esplende. As estrelas, que morreram, ressuscitadas todas, numa difusão de brilhos vivos – pirilampos do infinito – (que) porfiam-se em tremelicar umas mais que as outras?”6 Até quando continuará apenas uma terra de promissão?
Ainda penso que seja possível vislumbrar o horizonte das possibilidades, mas como custa crer que seja tão difícil o futuro esplendente que tanto desejamos, e que começamos aqui a edificar, mas somente o alcançaremos plenamente na eternidade.

Desde o primeiro dia em que cheguei ao gabinete da Presidência, senti claramente a impotência e a fragilidade da nova condição, primeiramente pela celeridade do tempo, que urgia, como a areia da ampulheta a cair muito rápido. Eu tinha pouquíssimo tempo para o muito a fazer. O mandato tinha que ser propositivo, para além de queixas e ceticismo, alargado pela generosidade e o afã de acertar o passo especialmente na lisura administrativa e na ética de uma gestão pública exemplar.

Uma gestão que quis ser generosa, em meio a tantas mesquinharias e muitas maldades, invejas e pequenezes, e perigos incontáveis, e uma opressão sem tamanho, e a lógica de poder do mandonismo local, em que resisti de todas as formas ser subjugado, até a capitulação deste Legislativo ao Executivo Municipal, na última Sessão Ordinária, na tristíssima deliberação sobre o orçamento de 2011. Para enfrentar os tantos obstáculos existentes e fazer vencer tantos desafios, adotei desde o início a política da não-violência ensinada por Gandhi: não se combate a violência, com violência; não se enfrenta o mal, com o mal, mas com a benevolência lúcida, não ingênua, mas íntegra; e aquela disposição de não esgotar a paciência para não acirrar os conflitos e realmente promover a paz. Uma paz que brote da justiça, mesmo quando injustiçado, uma paz que quer o bem, mesmo a quem nos fez o mal, uma paz que busca afeição a todos, pois não sou juiz de quem quer que seja, e o quanto tive que exercitar a máxima de Jesus Cristo, como um empenho de caridade, que é, sem dúvida, uma tarefa nada facil: “Amai os vossos inimigos!”

Foi uma experiência e tanto!

Eu precisava deste rasgão na carne para saber exatamente o que é a lógica do poder, quando propus, desde o início, a dimensão do serviço. O que pareceu fraqueza, foi um esforço de valor espiritual. Tive que aprender a mais compreender do que ser compreendido, mais dar do que receber, e perseverar nos bons propósitos. Não foi fácil, pois aonde a criatividade e a benevolência, aonde a boa iniciativa quer fazer vigorar a vida, vivemos o que o poeta lusitano expressou em seu verso célebre:

“Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.”?7
Os que acompanharam mais de perto a epopéia desta gestão, e com quem pude compartilhar em confidência autêntica, viu claramente com que sinceridade me imbui do melhor de mim, impulsionado pelo melhor das minhas tão poucas forças, para o bem desta Instituição, que a presidi com seriedade e dedicação, dinamismo e entusiasmo, e com trabalho em expediente integral, apresentando primeiramente o projeto para criar um ambiente favorável ao trabalho legislativo (com acomodações adequadas, tanto para os funcionários, quanto para os colegas edis e também para receber a população que aqui aflui cotidianamente), para depois afirmar esta Casa de elaboração de leis, também num espaço de formação e capacitação, numa Escola Política, de gestão pública, para formar cidadãos que queiram investir seu tempo também em estudos que permitam serem legisladores cada vez mais melhor preparados. Tudo isto apresentei do modo mais transparente e aberto, mesmo tendo sido vítima das mesquinharias mais ignominiosas, das omissões e do descaso, e dos que torceram e trabalharam contra, até abortarem todas as chances do projeto vir a lume, quando o Executivo, pouco a pouco, em estratégia de aguda ardilosidade, foi cerceando as possibilidades, e minando lentamente a autonomia deste Legislativo, na votação forçada pelo corte do orçamento. Mesmo assim, lutei com todas as forças, pedindo a Deus sabedoria e prudência, e uma ousadia que não fosse intempestividade, a iniciativa que não comprometesse a estabilidade, e aonde se esperava erguer o plenário mais de acordo com a Escola Política que se desejou instituir, não deixando que o mato crescesse, nem a desilusão, até encontrar a solução simples, de pouco recurso, de transformar o terreno deteriorado, num jardim de flores multicores, a indicar que a bondade e a beleza podem estar presentes, mesmo aonde tanto se quer negar o dom da vida. Todos sabem que não desisti, e trabalhei até hoje, nesta última Sessão, para por em prática cada iniciativa, visando o bem de todos.

“pois a vontade que não retrocede,
é como o fogo que ressurge ardente
a cada vez que a ventania o impede”8

Buscando fazer o que é certo (do ponto de vista moral, pois na linha de pensamento de Aristóteles associo a política à moral), tive de aprender (e como isso foi tão difícil) a lidar com quem não tem boa fé, com quem é astuto, com quem tem os lábios doces, mas o coração a urdir ciladas, com quem quis lançar-me à cova, de modo tão implacável. Mas São Miguel Arcanjo protegeu-me, sem dúvida! São Miguel, defensor da vida, cuja imagem permaneceu todos os dias na minha mesa de trabalho, juntamente com a ampulheta de areia azul turquesa, a lembrar a provisoriedade da minha função diretiva nestes dois anos de intenso labor.

“Eu reconheço que tudo podes e que nenhum dos teus projetos fica sem realização!”9

São as palavras de Jó que reconhece em Deus a força de todo o poder, e é n’Ele quem confio plenamente a realização de todo bom empreendimento. Dou graças a Deus por ter conseguido também com esforço incomum, cumprir com o principal objetivo deste mandato como Presidente: a promulgação da reforma da Lei Orgânica do Município (compromisso de campanha cumprido), que tornou São Bento do Sapucaí, no campo legislativo o primeiro a reconhecer em lei o direito à vida como o principal de todos os direitos humanos, desde a fecundação até a morte natural. Com isso, posso afirmar com alegria que sou hoje um legislador defensor da vida e da família, a primeira e principal das instituições humanas. Um legislador realmente comprometido com o humanismo integral, que coloca a dignidade da pessoa humana como prioridade, pois o valor humano tem primazia sobre a eficácia técnica, pois a lei existe para proteger a vida humana aonde ela está mais fragilizada e até ameaçada, porque temos o dever de trabalhar para atender as necessidades materiais e imateriais do povo, especialmente aquelas que asseguram tornar a vida das pessoas, e seus relacionamentos, sempre cada vez mais humanos e dignos. A presença do bispo da Diocese de Taubaté na sessão solene de promulgação da lei orgânica, no momento em que juntamente com a comissão especial apresentamos a nova legislação na sacada principal deste edifício, foi o momento culminante da gestão que ora se encerra: proposta principal do mandato cumprida, para dar credibilidade à vocação e à missão de evangelizar também no difícil campo político.


“Ó Deus, minha parte na herança e minha taça, meu destino está em tuas mãos!”10

Nem tudo sonhado e trabalhado infatigavelmente foi concretizado. Muita semente lançada ficou em meio aos espinhos, e também em terra desértica, em meio a corações de pedra, e secadas pela inveja. De todos os pecados capitais, este foi o que mais corroeu muito dos melhores propósitos, apesar de ter sido bem sucedido, no principal de todos, porque foquei, priorizei, e não descuidei (inclusive da oração) pois, as vitórias obtidas só foram por meio da ação de Deus, Todo-Poderoso, como graça salvífica.
Certamente outras sementes se encontram fecundadas na terra. Quem sabe a seu tempo venham à luz do dia, dar seus bons frutos.
Dos compromissos de campanha, de dez pontos, sete foram cumpridos. E muito mais, além da obrigação, pois fiz desta gestão, realmente movido por idealismo, de mandato integral, estando aqui de manhã, à tarde e muitas vezes à noite, buscando meios de otimizar a atividade legislativa, valorizando esta Casa também como espaço de formação, daí a realização de tantos cursos, encontros, reuniões, audiências públicas, debates, tribuna livre, enfim, todas as formas que pudessem propiciar um melhor intercâmbio de idéias e propostas, para decisões mais acertadas e sempre colegiadas. Daí que adquirimos livros para uma biblioteca jurídica, que possa oferecer subsídios aos vereadores, especialmente às assessorias técnicas, para a elaboração de leis com sólida fundamentação. Também a recuperação das atas antigas, desde 18 58, viabilizou assegurar em nosso arquivo, documentos importantes que servirão de referência para uma história do Município de São Bento do Sapucaí, tendo eu alinhavado uma “história das origens do Município”, a partir do contato com tais documentos, que foram transcritos por paleógrafos da mais alta competência.
Procuramos tratar cada vereador com o respeito que lhe é devido, seja da situação ou da oposição, pois desde o início tive muito claro o dever de legislar com discernimento. Adquirimos computadores para cada vereador, buscando atender em suas demandas diárias, com a equidade que se faz necessária no atendimento do que foi solicitado, dentro das possibilidades. Também a população que aqui afluiu neste período, buscando orientar, encaminhar, dar esclarecimentos e informações que pudessem auxiliar no atendimento de suas necessidades. Também valorizamos a cultura local, primeiramente cumprindo o compromisso de campanha de viabilizar a aprovação do Fundo Municipal de Cultura, e ainda trazendo, dentro do possível, artistas, poetas, compositores e músicos que pudessem apresentar seus trabalhos sempre no início das sessões ordinárias. Foram três Sessões Solenes, uma delas inesquecível no bairro do Quilombo, a primeira sessão solene itinerante, e depois neste ano, tivemos outra sessão itinerante no bairro do Cantagalo, e esta de encerramento e transmissão do cargo.
Tudo fizemos para aproximar a população das tomadas de decisão, quando projetos controversos deram entrada nesta Casa de Leis, chamamos o segmento da sociedade para conversar, seja em nosso gabinete, ou mesmo em audiências públicas. Trabalhamos nesse sentido, por um mandato inteiramente transparente, aberto, democrático e participativo, apesar de sombras tão espessas do obscurantismo.

De tudo o que foi proposto, restou-me apenas um jardim como esperança de aconchego, cujo pergolado ainda aguarda robustecer a primavera, e quem sabe os passarinhos virem fazer ninhos e cantar suave nas manhãs azuis destas montanhas tão reconfortantes, pois eu não saberia mais como suportar os dias se não fosse a vista destas montanhas, e os ipês amarelos a despontar na paisagem como jóias vivas da natureza, aqui tão exuberante!

“Ponde fim à malícia dos ímpios e sustentai o direito, ó Deus de justiça, que sondais os corações e os rins”.11

Vós sabeis, ó Deus, com que verdade de sentimentos, com que sinceridade trabalhei todos estes dias, a enfrentar tantos dissabores, e com cuidado milimétrico para não cair no precipício, porque os ímpios realmente não tiveram piedade e humanidade, quando muitas luzes poderiam avivar ainda mais as melhores possibilidades, visando o bem de todos.
E então, mesmo em ousadias tantas, dentro da legalidade e da legitimidade, procurei não descuidar da prudência (tendo a oração de Salomão no coração, a rogar por sabedoria); e me posicionei contra a opressão (foram três mandados de segurança contra o Executivo Municipal), e quando foi votado o orçamento, tinha sobre mim a ameaça de um litígio judicial “até o quinto dos infernos”, a comprometer a obrigação primária. Então, para assegurar a aprovação das contas, tive de optar pela prudência, pois os inimigos queriam que eu fosse intempestivo, mas consegui (certamente por uma proteção divina) estancar o litígio, e fazer o que os Salmos recomendam (“dentro das possibilidades”), sem me calar diante da opressão, pois “quem aceita a opressão, nela consente!”12 Tudo está registrado nas atas, para que se compreenda de que modo estamos ainda muito longe da democracia, de que o direito existe para os fortes, de que os fracos continuam sendo oprimidos, e de que os guardiães da lei ficam sempre ao lado dos mais poderosos. Tudo isso ensinou-me que enquanto o forte (com astúcia e marketing) continuar oprimindo os fracos, enquanto a lei continuar não sendo cumprida, a democracia será apenas uma falácia, uma retórica, um embuste!

Quando me disseram que aqui não haveria espaço para a amizade, pensei que fosse ser capaz de um liame afetivo que pudesse suscitar aquele “fazer algo juntos”, para o bem de todos. Mas me vi como a personagem de Balzac, nas Ilusões Perdidas: “Enquanto um homem estiver no Ministério, aplaudem-no; caído, ajudem a arrastá-lo para o lixo!”

“Como estamos todos na realidade presos pelas potências que de um modo anônimo nos manipulam”13, não podemos mesmo por todas as esperanças no poder deste mundo, pois “a história não pode ser regulada longe de Deus por estruturas simplesmente materiais”14. Daí que o que nos sustentam e nos dá alegria de ver os bons propósitos se realizarem, é que, muitas vezes, os sucessos no mundo podem iludir e até nos afastar do projeto primevo, daquele que é o projeto verdadeiro, concebido e querido por Deus, mas que requer a participação do nosso trabalho. Nesse sentido, quando buscamos afirmar realmente os valores das bem-aventuranças, com a convicção de que estamos ajudando a construir o projeto de Deus, que um dia chegará a ser realidade, com vida plena, e que nós, aqui, com o nosso trabalho deficiente, mas benevolente, almejamos alcançar, pela graça de Deus. Por isso, “quem segue a vontade de Deus sabe que nunca deixará de ter a sua proteção ante todo e qualquer horror com que se confronta... Sabe que o fundamento do mundo é o amor e mesmo aí, onde ninguém pode ou quer ajuda-lo, pode continuar a confiar Naquele que o ama”15.
De tudo o que foi vivido nestes dois anos, ficaram muitos ensinamentos, talvez o mais importante que aqui destaco: Vida e amor são a mesma realidade. Aonde falta o amor, a vida carece de sentido, fica diminuída, chega até a morrer. É o amor que vivifica tudo, que salva o que se encontra em perigo, que propicia a vida mesma como milagre. Mesmo que planejemos tudo tecnicamente, a vida é feita do imponderável. “Só Deus tem nas suas mãos os cordelinhos do mundo”16. Creio nisso firmemente: “o Senhor tem poder no céu e na terra. E só quem tem este poder todo é que tem o poder autêntico e redentor. Sem o céu, o poder terreno permanece sempre ambíguo e frágil. Somente o poder que se coloca sob a medida e o juízo do céu – isto é, de Deus – pode tornar-se poder para o bem. E só o poder que se coloca sob a benção de Deus pode ser seguro” 17.
Ao menos tenho procurado ser um político que cumpre a palavra dada, por isso busquei pautar-me pela coerência de vida, sendo fiel a Jesus Cristo, que, para mim, é convictamente o mestre dos Mestres e o paradigma da perfeição. Deixo hoje a Presidência desta Câmara Municipal, mas assumo com mais alegria e convicção o atendimento ao chamado vocacional do encargo permanente – até para depois da morte – de ser (apesar de tão grande pecador que sou) um fidedigno embaixador de Cristo, pois sei que Ele é compassivo e misericordioso e, acima de tudo, nosso único Senhor e Salvador.

“Valeu a pena?

Fiquei realmente impactado com o nível agudo de maldade e mesquinharia na lógica do poder (do poder do mundo). Tive a expectativa e a esperança de encontrar aqui, especialmente entre os colegas vereadores, um relacionamento em que fosse possível experimentar a beleza e a força unitiva e salvífica da amizade, mas percebi, que o que prevalece mesmo é uma terrível lógica de interesses imediatistas, e me vi em meio a muitos perigos justamente porque muitos desejaram que eu caísse em precipício e maculasse o meu mandato propositivo e generoso que busquei oferecer a todos. E quando o Tribunal de Contas aprovou as minhas contas (inteiramente regulares), fiquei gratificado, pois as iniciativas foram muitas, e os dardos incontáveis. Esta grandeza de alma foi encontrando um tão grande número de obstáculos e de pressões como que querendo não apenas apequená-la, mas reduzi-la a muito mais que o mínimo de suas forças, até mesmo ao pó de suas possibilidades.
Houve uma pedra no meio do caminho, e não tive como removê-la por minhas próprias forças. Lembrei-me então de Jesus quando, removeu a pedra do sepulcro em que estava Lázaro, chamando-o à vida ressurecta.

Não é fácil, muitos talvez não entenderam a dimensão dessa missão, por isso se omitiram quando tinham que se unir para evitar a opressão, deixando-me sozinho no enfrentamento da Medusa. Mesmo assim não recuei o passo, cauteloso, mas sempre esperançoso do bem. Fizeram de tudo para me humilhar, implacável e impiedosamente, mas consegui, como disse há pouco, manter a fidelidade à missão evangelizadora.

Este mandato foi mesmo uma luta pela defesa da vida, especialmente da vida desta Instituição, agrilhoada pelo mandonismo local, pelo clientelismo, populismo, e toda espécie de arcaísmos de uma política fossilizada como nos tempos da República Velha. Busquei uma abertura, um arejamento, mas os colegas vereadores acharam melhor ficar no comodismo, desmotivando-me a cada passo em busca das melhorias desejadas. Mas a pedra no meio do caminho foi gigantesca, e se não pude removê-la, ao menos – sob a proteção de São Miguel Arcanjo - consegui não ser esmagado por ela, o que faltou muito pouco para um estrangulamento fatal. Para garantir a estabilidade da gestão (o cumprimento das obrigações cotidianas), tivemos que recuar o passo, pois a retaliação seria fulminante. Fui um Presidente de muitas iniciativas, é certo, como disse alguém, mas trabalhei incansavelmente cada dia por um mandato fecundo e edificante. Não quis entregar a Deus a moeda como a recebi, e todo este esforço foi por devolver a moeda como talento multiplicado.

Foi para não ver a relva sem flores, nem deixar de adubar com o húmus o que requer acolhida e cuidado especial, pois a vida humana exige proteção integral, desde o seu início, com a fecundação, e solicita atenção contínua para vicejar e propiciar os bons frutos. Pois nesta missão, o que fica são mesmo os frutos de humanidade (muito mais do que resultados técnicos); fica mais e vale mais o essencial e o qualitativo, o bem feito em silêncio, a generosidade anônima, os sacrifícios e as dores que só Deus conhece. Tudo para ver fulgurar a melhor poesia:

“Alguma quimera torna tão afável o mundo, por mais ambigua a afaga e tudo vale a pena! (...) Assim na doçura estéril de uma vida sem brilho, na doçura estéril de uma vida sem brilho, tempo só de fechar os olhos outra vez e é tudo um sono grande, sonão dos puros, dos queridos de Deus, para só acordar no amanhecer, com sabiá cantando no cambucazeiro, passarinhada madrugadeira dando bom-dia, enxameando as franças em matinal azáfama, folgando floreado nas fruteiras em festa, à roda das janelas banhadas nas tonalidades loiras e tenras da aurora!” 18

Acredito nisso: em dar vida, em cultivar a vida, em afirmar a coragem e a energia para o bem, para que todos tenham vida e a tenham em abundância.” 19
Encerro então estas minhas palavras, com o mesmo verso do bardo português: “Valeu a pena? Tudo vale a pena se a alma não é pequena!”20

VER. HERMES RODRIGUES NERY

Bibliografia:

1. Eugenia Sereno, O Pássaro da Escuridão, Editora Nova Fronteira/Pró-Memória – Instituto do Livro, 5ª ediçao, 1984, p. 269.
2. Gilberto de Mello Kujawski, A Pátria Descoberta, Papirus, 1992, p. 40.
3. Jo 18, 36
4. Eugenia Sereno, O Pássaro da Escuridão, Editora Nova Fronteira/Pró-Memória – Instituto do Livro, 5ª ediçao, 1984, p. 351.
5. Eugenia Sereno, O Pássaro da Escuridão, Editora Nova Fronteira/Pró-Memória – Instituto do Livro, 5ª ediçao, 1984, p. 351.
6. Eugenia Sereno, O Pássaro da Escuridão, Editora Nova Fronteira/Pró-Memória – Instituto do Livro, 5ª ediçao, 1984, p. 351.
7. Fernando Pessoa, Mensagem, Mar Português
(http://www.grijalvo.com/Citas/b_Pessoa_Mar_portugues.htm)
8. Dante Aleghieri, A Divina Comédia, Segundo Volume, Paraíso, Canto IV, 76, Villa Rica Editoras Reunidas Ltda, p. 325.
9. Jó 42, 2
10. Sl 16, 5
11. Sl 7,10
12. Dante Aleghieri, A Divina Comédia, Segundo Volume, Paraíso, Canto IV, 76, Villa Rica Editoras Reunidas Ltda, p. 325.
13. Joseph Ratzinger – Bento XVI, Jesus de Nazaré, Editora Planeta do Brasil, 2007, p. 35.
14. Joseph Ratzinger – Bento XVI, Jesus de Nazaré, Editora Planeta do Brasil, 2007, p. 45.
15. Joseph Ratzinger – Bento XVI, Jesus de Nazaré, Editora Planeta do Brasil, 2007, p. 49.
16. Joseph Ratzinger – Bento XVI, Jesus de Nazaré, Editora Planeta do Brasil, 2007, p. 64.
17. Joseph Ratzinger – Bento XVI, Jesus de Nazaré, Editora Planeta do Brasil, 2007, p. 49.
18. Eugenia Sereno, O Pássaro da Escuridão, Editora Nova Fronteira/Pró-Memória – Instituto do Livro, 5ª ediçao, 1984, p. 257.
19. Jo 10, 10
20. Fernando Pessoa, Mensagem, Mar Português (http://www.grijalvo.com/Citas/b_Pessoa_Mar_portugues.htm)

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