terça-feira, 9 de novembro de 2010

Um olhar para a eternidade – Parte IV


Queridos irmãos, a paz! Dando continuidade, neste mês de novembro, ao estudo sobre o purgatório, conheceremos a natureza do fogo que purifica as almas e veremos também que é possível ir diretamente para o céu, sem passar pelo purgatório.


“O único corpo místico de Cristo”
O Concílio Vaticano II afirmou com clareza: a Igreja que está na terra, a que está no céu e a que está no purgatório constituem “o único Corpo Místico de Cristo, seja na diversidade de seus estados, seja nos diversos dons do Espírito Santo”. Portanto, é importante destacar que as almas do purgatório são parte viva e integrante do Corpo Místico de Cristo: o texto da Lumen Gentium assim o diz claramente.

É essencial perceber como idéia fundamental que nós, peregrinos sobre a terra, os nossos irmãos no céu e as almas do purgatório constituímos, todos juntos, o Corpo Místico de Cristo, embora com funções diferentes e num grau diferente, no que diz respeito à colaboração que cada um de nós oferece à obra da redenção. É importante compreender que as almas do purgatório estão inseridas no Corpo Místico de Cristo e entender sua função específica, que é a de ficar purificadas. São membros vivos, não galhos cortados, mas estão terminando sua purificação para o céu. O purgatório é seguramente o lugar da salvação, é o lugar onde está presente, como diz a Lumen Gentium, a seiva viva do Corpo Místico de Cristo, que é precisamente o Espírito Santo.

O fogo de amor que purifica a alma
Nós não somos obrigados a acreditar que exista fogo no purgatório como existe no inferno. Em relação ao inferno, o magistério da Igreja fala claramente de penas dos sentidos, e nós nos referimos a estas penas dos sentidos com a palavra fogo. Ao contrário, quanto ao purgatório nós não somos obrigados a pensar que haja uma pena dos sentidos, e podemos muito bem entender o fogo do purgatório como sendo o fogo do amor de Deus que purifica as almas.

Entrando mais profundamente no coração desta reflexão teológica, consideremos aquilo que o Concílio disse: também as almas do purgatório fazem parte do Corpo Místico de Cristo. Também nas almas do purgatório trabalha e age o Espírito de Cristo, que é o Espírito Santo, o Espírito de Amor; e o fogo do purgatório é o próprio fogo de amor do Espírito Santo, que penetra nas profundezas destas almas, em suas raízes, as purifica de seu egoísmo, as capacita a amar, as conduz à perfeição do amor. Portanto, o purgatório é a grande escola do amor perfeito, cujo mestre é o Espírito Santo, que atua diretamente sobre as almas.

Esse ensinamento nos vem principalmente de uma grande mística, Santa Catarina de Gênova, mas tornou-se também o ensino de muitos teólogos atuais: um lugar onde o fogo do amor de Deus purifica as almas do egoísmo e as torna capazes de amar. Lugar de sofrimento, porque ainda não se pode ver Deus face a face. Mas também lugar de alegria: primeiro, porque já existe a certeza da felicidade (enquanto que no inferno existe a certeza da condenação); depois, porque em certo sentido já existe a possibilidade de se comunicar com Deus através da oração; e finalmente porque já se pode usufruir do grande mistério da comunhão dos santos, que dá às almas do purgatório a possibilidade de rezar pelos vivos e aos vivos a de rezar por elas. A este respeito, deve-se salientar, como vimos nos textos, que as almas do purgatório podem rezar por nós e seguramente o fazem, para que possamos alcançar o fim da vida, que é a felicidade eterna, para a qual essas almas estão se encaminhando. Mas também nós podemos rezar por elas e ajudá-las com a oração, os sacrifícios, a penitência, os sufrágios e as indulgências.

É possível ir para o céu sem passar pelo purgatório
Gostaria de concluir dizendo que nós não somos obrigados a ir para o purgatório. Se já nesta terra nos purificarmos do egoísmo e soubermos construir em nós mesmos uma capacidade perfeita de amar, nós podemos ir desta terra para o céu sem passar pelo purgatório. Por que o bom ladrão não passou pelo purgatório? Porque, apesar da sua vida de pecado, soube exprimir, sobre a cruz, um ato perfeito de fé e um ato perfeito de contrição. A perfeita contrição nos habilita a entrar diretamente no céu.

Mas como chegar à perfeita contrição, isto é, ao desgosto de ter ofendido a Deus infinitamente bom e digno de ser amado sobre todas as coisas, de não haver correspondido ao seu amor? A intuição do amor infinito de Deus, que percebemos sobretudo através da cruz , o desgosto de não haver correspondido a esse amor, a oferta a Deus do nosso arrependimento e o desejo de amá-lo sobre todas as coisas: esta atividade interior tão sublime, que é obra do Espírito Santo em nós, se repetida todos os dias com muitos pequenos atos de amor, realiza em nós a radical purificação do coração, o dilata sempre mais em direção a um amor perfeito, e assim creio eu que já nesta vida possamos alcançar as condições de entrar diretamente no céu. Além disso, as pessoas que aceitam sua doença e sofrem por amor, que vivem a sua morte como um ato de amor a Deus, que morrem como Jesus na Cruz, no abandono total à vontade de Deus, têm em si as condições para que Deus as acolha diretamente em seu reino, sem que passem pelo purgatório, porque seu coração já é capaz de amar, já está purificado pela dor e pela morte de toda a impureza do egoísmo.

Deus, considerando-os servos bons e fiéis no momento do julgamento, os faz entrar imediatamente no gozo do seu reino, dando-lhes a luz da glória, isto é, a capacidade de ver a Deus, e o amor da glória, a capacidade de amar a Deus, que são enxertadas em seu coração purificado. Desta forma, queridos amigos, através de uma vida empenhada, através do sacrifício da doença, através da aceitação da morte, podemos entrar imediatamente na alegria do Senhor sem passar pelo tempo de purificação no purgatório, que, entretanto, permanece sendo o lugar da salvação, da oração e do amor à espera da visão eterna de Deus.

Depois de termos provado a existência do purgatório a partir da Bíblia, da doutrina da Igreja e da tradição cristã, nós ainda não esgotamos o assunto, que é tão caro à piedade cristã, e queremos dedicar-lhe uma segunda reflexão, especialmente para entender qual a natureza do purgatório e que tipo de purificação as almas experimentam. Mas, de modo particular, neste capítulo iremos concentrar-nos na doutrina de uma santa, Catarina de Gênova, autora de algumas das páginas mais agudas e mais elevadas que jamais foram escritas sobre o assunto.

Enquanto isso, resumindo as considerações feitas no capítulo anterior, vale à pena lembrar que o purgatório é o lugar da salvação, onde Deus opera com seu amor, onde é amado pelas almas, louvado, celebrado, onde as almas lhe rendem graças. Portanto, é uma realidade substancialmente diferente daquela do inferno. Além do mais, devemos tentar entender o purgatório não a partir do inferno, como às vezes foi feito no passado, mas a partir do céu. Sem dúvida, a condição humana no purgatório é muito mais próxima à dos bem-aventurados no céu. No entanto, enquanto que o céu é um lugar onde existe uma relação perfeita de amor entre Deus e suas criaturas, que já atingiram a capacidade perfeita de amar, o purgatório é o lugar onde Deus, ainda não contemplado face a face, opera para purificar as almas, cuja capacidade de amar ainda é imperfeita. Por isso, o purgatório é já um lugar de salvação, mas, ao mesmo tempo, de purificação.

Após reiterar estes pontos, gostaria agora de tentar entender algo mais sobre o purgatório, sobre a natureza de suas penas e de suas alegrias, não mais com base na teologia oficial e no ensino da Igreja, mas nos ensinamentos de Santa Catarina de Gênova. Devemos reconhecer que o ensino desta santa, expresso há tantos séculos atrás num pequeno tratado sobre o purgatório, está exercendo uma influência significativa no pensamento contemporâneo: os livros atuais de teologia e de espiritualidade no âmbito deste tema reproduzem amplamente as idéias contidas nas poucas páginas (cerca de vinte) de Santa Catarina: páginas de uma tal profundidade que, podemos dizer, depois dele não se escreveu muito mais sobre esse tema, nem mesmo em tratados mais extensos. (a ser concluído na próxima semana)

Traduzido do italiano para o português, por Tania

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