terça-feira, 26 de outubro de 2010

Um olhar para a eternidade – Parte II


Queridos irmãos, a paz! Damos hoje continuidade ao estudo sobre uma realidade que sempre tocou muito de perto o coração dos católicos: o purgatório. O estudo é longo e será postado em partes, mas vale a pena ser lido, porque temos muito a aprender com ele. A primeira parte se encontra na categoria Pe. Livio Fanzaga, um entusiasta das aparições da Rainha da Paz e diretor da Rádio Maria, uma rádio católica italiana.

A doutrina da Igreja sobre o purgatório
O primeiro problema difícil a respeito do purgatório é aquele que separa os irmãos protestantes de nós e dos nossos irmãos ortodoxos. Mas, além deste, há um ainda maior – e também este toca em pontos muito importantes da teologia e da vida espiritual – que diz respeito à natureza mesma do purgatório, isto é, em que ele consiste realmente e qual a nossa relação com os falecidos.

Na nossa meditação, que, embora breve, deve abordar todos os pontos fundamentais desta verdade, procuraremos primeiro deixar bem claro qual o ensinamento da Igreja: a Igreja é para nós a autoridade divina, pois Cristo lhe deu esta autoridade e é assistida pelo Espírito Santo na interpretação da Sagrada Escritura. Este ensinamento tem raízes no texto bíblico e também na tradição. Em seguida, vamos tentar entender, através da reflexão teológica, em que consiste o purgatório. Finalmente, levando em consideração a devoção dos fiéis, vamos investigar quais são as nossas relações com as almas do purgatório: temática muito rica, muito cara ao coração cristão, e que certamente pode oferecer consolação a muitas pessoas para o drama da separação dos entes queridos. Também porque, penso eu, muitas pessoas, através disso, poderão recuperar a serenidade, descobrindo uma relação nova e mais profunda com seus entes queridos e, talvez, reforçando a sua fé na vida após a morte.

Penetrando, portanto, mais profundamente no nosso tema, vamos em primeiro lugar procurar dar uma definição do purgatório. O que é o purgatório? Ainda é difícil discutir, como fizemos a respeito do céu e do inferno, se o purgatório é um lugar ou apenas um estado. No que tange ao paraíso e ao inferno, não há dúvida de que são forçosamente lugares, porque no inferno, como no paraíso, estarão também os corpos no fim do mundo. No purgatório, ao contrário, sabemos que estão apenas as almas, porque o purgatório terminará no fim do mundo, quando os corpos ressurgirão. Portanto, tentaremos dar uma definição do purgatório a partir da reflexão teológica e, sobretudo, das indicações do magistério da Igreja. Assim, pode-se definir o purgatório como sendo o estado daqueles que morreram na paz de Cristo, mas que ainda não estão suficientemente puros para poderem ser admitidos à visão de Deus.

Por que existe o purgatório?
Como veremos, este ensinamento da Igreja foi afirmado com firmeza, mesmo a nível conciliar, e o encontramos claramente expresso em pelo menos um texto bíblico. Mas me parece oportuno refletir sobre o fato de que, no fundo, o purgatório tem uma razão profunda de existir, que é muito acessível à reflexão de todos. De fato, qual o destino que nos espera se formos fiéis à Palavra de Deus? Dissemos que o purgatório é o estado daqueles que morreram na paz de Cristo, por isso é já um estado de salvação, no qual estão presentes a oração e o amor, mesmo não havendo a visão de Deus. Bem, além daquilo que ensina o Magistério da Igreja e que nos diz, em termos muito explícitos, o Livro dos Macabeus, há uma razão muito profunda que justifica a existência do purgatório, que é também a mesma pela qual a sua própria noção se tornou fácil de aceitar pelos fiéis: em termos muito simples, o purgatório existe porque existe a tendência do homem à mediocridade e à tibieza; porque o homem nesta vida talvez não seja capaz, ao menos em geral, de expressar atos de amor tão perfeitos que permitam que sua alma entre imediatamente na visão de Deus.

A este respeito, gostaria de ler outra página muito incisiva de Mons. Maggiolini: “Seria lindo (...) que a liberdade humana fosse capaz apenas do positivo ou do negativo em grau máximo, sem reservas e sem resistência: somente conversões sem reservas e de uma maneira radical, ou o dar as costas a Deus sem medidas, sem diplomacia”. No entanto, como sabemos, isso não acontece. As nossas rebeliões acontecem parcialmente, ao longo do tempo, quando nos deixamos conduzir pela tendência a nos apegarmos a coisas e a pessoas, ou a fixar-nos em nós mesmos, sem sequer enfrentar o desconforto de um não seco a Deus; quando enchemos o coração com outras coisas e constatamos que Deus não está mais ali, que Ele saiu do nosso horizonte de atenção e de direção.

O teólogo diz que, mesmo quando nos rebelamos contra Deus, no fundo não conseguimos nunca expressar-Lhe um não radical e total. Ele continua: “É como preparar-nos para o desespero sem um único ato que possa ser de um heroísmo perverso, satânico ou prometeuco. Seria como descobrir que se está nas profundezas da culpa, mas chegando a esta descoberta aos poucos, seguindo a pequenos passos num plano inclinado, quase imperceptivelmente, por distrações, e o inferno seria alcançado por amadores, nem ao menos por profissionais da culpa”.

Na verdade, as pessoas perversas são raras. O que ocorre é outra coisa. É o caso de quem se entregou a Deus, mas conservando para si algum recanto da própria alma, sem tirar todas as conseqüências de uma revisão de vida, sem empenhar toda a vontade em responder ao apelo da graça, permitindo-se, em parte, ceder às más propensões. Um renovar-se, mas não deixando que Deus peça tudo; um libertar-se do mal, mas desejando-o ainda um pouco. Um decidir-se por Deus, mas quase pedindo-Lhe que não leve nossa palavra totalmente ao pé da letra. Um escolher a luz, mas com a persistente fascinação mórbida do claro-escuro. Acertadamente, este teólogo observa que nós não somos completamente maus, mas também não somos radicais no bem. Na verdade, muitas vezes somos mornos no bem. “A fé chama a estas nossas pequenas traições ao bem de pecados veniais, que são a falta de vigor na caridade, a falta de prontidão resoluta em abandonar o fascínio pelas trevas. É entregarmos o coração a Deus, mas mantendo-nos presos a algum sentimento, a alguma compensação. É dar tudo, exceto alguma coisa; é o deixar-se pregar na cruz, mas com uma só mão e um só pé”.

Belíssima esta imagem da nossa resistência em entregar-nos a Deus! Fica assim explicada a própria razão pela qual existe o purgatório: o fato de que a maioria das pessoas ficam incertas seja no caminho do mal, no qual não são tão radicais a ponto de alcançar a impenitência, seja no caminho do bem, no qual também não são tão radicais a ponto de alcançar o amor perfeito. E este é o estado em que elas morrem. A razão pela qual existe o purgatório é a mediocridade, é que muitos não são nem quentes nem frios, são mornos, não disseram nem não, nem sim a Deus. Por isso, não podem participar imediatamente da visão de Deus, da natureza divina: ainda estão cheios de impedimentos, devem completar o estado de purificação.

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